Noites de domingo.

Flávia Mello
3 min readJul 8, 2024

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As noites de domingo parecem trazer em minha memória as lembranças de infância, os momentos que já passaram e na minha cabeça passa um filme do que era a vida lá pro final dos anos 90–2004, como o mundo mudou de lá pra cá.

Aprendi a sentir nostalgia sem me lamentar por não possuir mais esses tempos passados, porque afinal só são especiais porque tiveram um fim, se durassem muito talvez perdessem a magia com o passar dos dias.

Eu gosto de lembrar como eram as noites de calor, passeando pela rua, com aqueles rostos agora envelhecidos, me lembro do café da tarde na casa de uma das minhas tias, tinha sempre manteiga, nunca margarina, minha bisavó adorava manteigas.

Era uma vida simples, mas todos tinham as mesmas coisas, meus amigos e eu, todos estávamos felizes, apesar dos pesares, não tinha tanta diferença entre nós, era tão bom.

Receber os tios que vinham nos visitar anualmente era sempre um evento, como se estivéssemos esperando o rei e a rainha Elizabeth, era sempre uma mesa posta, corações agitados e ansiosos esperando pelos tios que moravam um pouco longe, e que faziam questão de trazer um banquete de café da tarde.

Lembro-me da elegância e joias com pedras preciosas que a minha tia usava, tão baixinha e miuda, não sei onde ela arrumava espaço para guardar um coração tão grande. Meu tio um homem que aparentava as marcas do tempo em sua face, mas que era um homem intelectual, vez ou outra trazia fitas de videocassete de música clássica e filmes clássicos. — E claro, eu pegava todas para mim, porque mesmo sem saber muito, eu já tinha inclinação pra essas coisas desde antigamente.

A minha avó era uma mulher que foi filha de seu tempo, filha de uma mãe com mais de dez filhos e todas aquelas questões que cada época costuma ter sobre as gerações. Não vim aqui para apontar defeitos e tampouco transformar essas memórias em um muro de lamentações. Que Deus as tenha.

Agora olho para a mesa e todas as cadeiras estão vazias, todos esses personagens das minhas memórias partiram, mas eu os mantenho vivos dentro de mim, contando aqui para quem quer que venha a ler este texto — ou não, tanto faz.

Foram tempos bons, eu sinto muita falta das antigas locadoras, odeio plataformas de streaming, eu odeio o fato de terem destruído este mundo que um dia eu conheci e que foi tão bom, que agora está um pouco enferrujado, arranhado, cansado.

Mas, cá estamos, espero que as coisas um dia voltem a ter a simplicidade de antes, não espero perfeição ou uma sociedade mega avançada, não é disso que estou falando, me refiro à simplicidade em nossos corações.

Até um dia, quem sabe. Tal qual Machado, deixo o registro de minhas ‘memórias póstumas’ de tempos de ouro da vida humana que as estrelas e os céus um dia testemunharam, e que agora vivem em mim, como uma tentativa da própria natureza de se auto preservar, como se uma força dos espíritos dos nossos antepassados soprassem no peito de cada um de nós o não esquecimento, o próprio desejo de se tornarem eternos.

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Flávia Mello

Apaixonada pelo Conhecimento e obstinada pela Excelência.